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DISRAFISMOS ESPINAIS FECHADOS

 

 

INTRODUÇÃO

 

Os disrafismos espinhais ocultos (DEO) referem-se a um grupo de malformações das estruturas dorsais neuronais e mesenquemais da linha média, que diferentemente da espinha bífida aberta, apresentam-se cobertas pela pele. A classificação embriológica dos disrafismos espinhais fechados é baseada no estágio suposto em que o disrafismo ocorreu (gastrulação, neurulação primária ou neurulação secundária) TABELA 1.

 

EMBRIOLOGIA

Durante a gastrulação ocorre a formação das três camadas germinativas (ectoderme, mesoderme e endoderme) que induzem a formação da medula, pele e anexos. Malformações induzidas nesse período são diastematomielia e cistos neurentericos. A neurulação primária é responsável pela formação do tubo neural e sua divisão ectodérmica nos componentes neuronais e cutâneos. Durante esse período pode ocorrer falha do fechamento do tubo neural (mielomeningocele) ou falha na separação ectodérmica cutânea e neuronal (disjunção) que pode levar a lipomielocele dorsal ou seio dérmico. A neurulação secundaria é responsável pela formação da medula terminal (distal S2), cone medular, filum terminal e cauda equina. As alterações mais comuns geradas nesse período são lipoma (terminal, transicional ou caótico), filum terminal espessado ou mielocistocele terminal (1).

 

CLASSIFICAÇÃO

 

Filum terminal espessado

 

Presença de alteração histológica do filum terminal causando estiramento da medula espinhal. O diagnostico é feito pelo quadro clinico de medula presa e confirmado pela implantação baixa da medula. Outros indícios diagnosticas são: presença de gordura no filum terminal (lipoma de filum) ou filum maior que 2mm (filum espessado) (2).

 

Diastematomielia

 

Classicamente caracterizada por divisão da medula e/ou vertebra com presença de esporão ou septo ósseo intracanal medular. Pode ser classificada em tipo I que consiste em duas hemimedulas separadas por septo ósseo envoltas por saco dural independentes ou tipo II que consiste em duas hemimedulas contindas no mesmo saco dural, porém separadas por septo ósseo. A maior parte dos pacientes apresentam-se com estigmas cutâneos, escoliose, deformidade de membros inferiores ou sinais clínicos de medula presa FIGURA 1 (3).

 

Lipomielocele

 

Causa mais comum de DEO. Consistem na presença de disrafismo espinal associado a implantação de tecido adiposo na medula. Podem ser classificados em dorsais, terminal, transicionais e caóticos. A suspeita diagnostica pode ocorrer pelo simples abaulamento da região lombar até associação com quadro urológico, déficit motor/sensitivo ou deformidade de membros inferiores. O exame de ressonância magnética confirma o diagnostico com presença de tecido adiposo implantado na medula. A massa adiposa pode crescer de acordo com o crescimento da criança adquirindo grandes volumes na região lombosacral FIGURA 2,3 (4).

 

Seio dérmico


Resultante da separação incompleta da ectorderme neural da ectoderme epietelial gera presença de “corpos de inclusão” na medular com ou sem trajeto fistuloso para a pele. Esses “tumores dermoides” podem conter tecido epitelial e conteúdo de pele, cabelo ou glândulas sebáceas. Apresentam-se na linha média e a suspeita diagnostico é dada pela presença de ponto fistuloso lombosacral com ou sem saída de secreção local. A ressonância magnética confirma o diagnostico podendo mostrar o tumor dermoide implantado em altura diferente do ponto de fistulização pela pele (trato fistuloso) FIGURA 4 (5).

 

Mielocistocele terminal

 

 Caracterizada por abaulamento lombosacral normalmente associado a Síndrome de Regressão Caudal. Por tratar-se de malformação da neurulação secundária, o defeito ocorre no sentido rostral e, portanto, pode estar associado a malformações genitourinárias, agenesia caudal, persistência com extrofia cloacal. As Sindromes mais comuns associadas são OEIS (omphalocele, cloacal extrophy, imperforate anus, spinal anomalies) e VATER (vertebral anomalies, anal imperforation, tracheosophageal fistula, renal-radial anomalies) FIGURA 6 (6).

 

QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO


A apresentação da DEO varia amplamente, podendo ser completamente assintomático ou apresentar apenas uma anormalidade cutânea variando até paraplegia com extrofia cloacal. Os lactentes e crianças menores podem apresentar marcadores cutâneos ou deformidades ortopédicas; crianças mais velhas podem apresentar disfunção urinária, escoliose, dor ou déficits sensitivo/motores em membros inferiores. As lesões cutâneas mais comuns são dimples, lipomas, hemangiomas, assimetria glútea ou hipertricose FIGURA 5. A TABELA 2 mostra as possibilidades de apresentação clínica dos pacientes com DEO.

 

O diagnóstico pode ser realizado pela ultrassonografia que devido ao disrafismo permite analise intracanal medular. No entanto, o exame de escolha na suspeita de DEO é a ressonância nuclear magnética. O exame pode mostrar a altura da implantação da medula sugerindo medula presa abaixo de L2. Além disso, pode mostrar a presença de lipomas ou tumores dermoides com seu trajeto fistuloso até a pele. Nos casos de diastematomielia a tomografia de coluna pode auxiliar na analise e visualização do septo ósseo facilitando o planejamento cirúrgico do caso.

 

Disfunção da bexiga, incontinência urinária, distúrbios da função intestinal e continência retal são frequentes nos DEO, particularmente nas formas mais graves. A disfunção intestinal raramente ocorre isoladamente e sem disfunção do trato urinário inferior. Os pacientes devem ser submetidos a avaliação urológica e teste urodinâmico que não só auxiliam no diagnóstico, como servem de base para comparação pré e pós operatórios (8).

 

 

Tratamento

O tratamento cirúrgico dos DEO visa o desancoramento medular e reparo das estruturas neuronais e anexos evitando assim deterioração neurológico ao longo do tempo. Dentre os diversos tipos de DOE algumas situações especiais devem ser descritas como abaixo.

 

Filum terminal espessado

 

O achado na RNM de filum maior que 2mm ou lipoma de filum é de 1,5 a 5,5% na população e pode estar associado a medula presa isoladamente ou associadamente ao DEO. Não é recomendada o desancoramento medular profilático de pacientes assintomáticos com achado incidental de filum espessado, exceto na criança com implantação inequívoca baixa da medula (9). O tratamento cirúrgico consiste em abertura dural e idenficação do filum terminal espessado com secção do mesmo.

 

Lipomielocele (10)

 

A lipomielocele pode ser considerada um dos DEO mais controversos em seu tratamento. No entanto, Pang et al evidenciaram que, apesar do risco de piora clínica e complicações com fístula liquórica pós operatória,  a ressecção completa de lipoma tem melhor prognostico neurológico que o seguimento clinico de pacientes assintomáticos e/ou a ressecção parcial do lipoma.

Os lipomas podem ser divididos em dorsais, terminais, transicionais e caóticos. Independentemente do tipo de lipoma, o tratamento deve ser a ressecção total com desancoramento medular.

 

A técnica cirúrgica deve conter os passos:

1) exposição e dissecção do lipoma extraespinhal e sua haste de interiorização dural;

2) desancoramento do lipoma da dura mater e identificação das bordas durais;

3) ressecção do lipoma com identificação de linha de fusão entre o lipoma e o plano fibrótico medular;

4) neurulação pial com sutura do placode neurla;

5) ampliação da canal dural com enxerto dural. Fatores de melhor prognóstico são a utilização de monitorização eletrofisiológica intraoperatória e a ampliação do canal medular com o enxerto dural. Segundo Pang a relação medula-saco dural maior que 50% tem cerca de 4 vezes mais chance de deterioração neurológica se comparada a uma relação de 30%.

Essa analise mostra a importância de ampliação de realização de enxerto dural durante o procedimento.

 

 

Diastematomielia

 

O tipo I é mais grave e geralmente associado a malformação e deformidade vertebral e, portanto, existe um risco maior de deterioração ao longo do tempo. Cirurgia para crianças assintomáticas ou com déficits fixos é indicada devido ao declínio neurológico progressivo sem o desancoramento medular. A cirurgia pode ser conduzida com pouco risco de novas lesões. O tipo II é mais simples, tendo um curso benigno; o acompanhamento observacional é apropriado na maioria (11).


O tratamento cirúrgico deve-se realizar a retirada do esporão ósseo que divide a medular realizando o desancoramento medular.

 

Seio dérmico

 

Nos casos de seio dérmico normalmente existe um lúmen dentro do pedículo fibroneural que predispõe ao abscesso espinhal, meningite recorrente ou implante de tumor dermóide intraespinhal. Dados tais riscos e baixas complicações da cirurgia, a excisão é recomendada independentemente dos sintomas. Os resultados neurológicos e urológicos são bons após a cirurgia, desde que o reparo seja realizado antes que ocorram danos ou cicatrizes secundárias à infecção (5).

O tratamento cirúrgico deve ser realizado com analise da RNM e identificação da altura do pedículo na pele e implante do tumor dermoide intradural. Inicialmente identifica-se o pedículo dissecando-o até sua interiorização na dura mater. Muitas vezes as o tumor dermoide está em nível diferente do aparecimento do pedículo na pele. Após abertura dural deve ser realizada ressecção total da lesão, pois a ressecção parcial está associada a recidiva da lesão.

 

 

REFERÊNCIAS

 

1. Thompson DN. Spinal dysraphic anomalies; classification, presentation and management. J Paediatr Child Health. 2014; 24:431–438.

2. Cools MJ, Al-Holou WN, Stetler WR, et al. Filum terminale lipomas: imaging prevalence, natural history, and conus position. J Neurosurg Pediatr. 2014;13:559–567.

3. Pang D, Dias MS, Ahab-Barmada M. Split cord malformation: Part I: A unified theory of embryogenesis for double spinal cord malformations. Neurosurgery. 1992;31:451–480.

4. Chapman PH. Congenital intraspinal lipomas: anatomic considerations and surgical treatment. Childs Brain. 1982;9:37–47.

5. Tisdall MM, Hayward RD, Thompson DN. Congenital spinal dermal tract: how accurate is clinical and radiological evaluation? J Neurosurg Pediatr. 2015;15:651–656.

6. Pang D, Zovickian J, Lee JY, Moes GS, Wang KC. Terminal myelocystocele: surgical observations and theory of embryogenesis. Neurosurgery. 2012;70:1383–1404; discussion 1404–1385.

7. Cochrane DD. Occult Spinal Dysraphism. In: Albright AL, Pollack I, Adelson P, editors. Principles and practice of pediatric neurosurgery. New York: Thieme; 2015. 308–324.

8. Hsieh MH, Perry V, Gupta N, Pearson C, Nguyen HT. The effects of detethering on the urodynamics profile in children with a tethered cord. J Neurosurg. 2006;105:391–395.

9. Bui CJ, Tubbs RS, Oakes WJ. Tethered cord syndrome in children: a review. Neurosurg Focus. 2007;23:E2.

10. Pang D, Zovickian J, Oviedo A. Long-term outcome of total and near-totalresectionofspinalcordlipomasandradicalreconstruction of the neural placode, part II: outcome analysis and preoperative profiling. Neurosurgery. 2010;66(2):253–272; discussion 272–253.

11. Proctor MR, Scott RM. Long-term outcome for patients with split cord malformation. Neurosurg Focus. 2001;10:5e5.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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FIGURA 1: tomografia de coluna dorsal evidenciando septo ósseo com divisão medular em duas hemimedulas em caso de diastematomielia.

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FIGURA 2- Deformidade de membros inferio
FIGURA 2- Deformidade de membros inferio

FIGURA 2: Deformidade de membros inferiores e abaulamento lombosacral constituido por tercido gorduroso em caso de lipomielocele.

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FIGURA 3: Ressonância magnética de paciente com lipomielocele

FIGURA_5-_Estigmas_cutâneos_comuns_nos_d
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FIGURA_5-_Estigmas_cutâneos_comuns_nos_d

FIGURA 5: Estigmas cutâneos comuns nos disrafismos espinhais ocultos

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FIGURA_4-_Imagem_ilustrativa_e_RNM_de_se

FIGURA 4: Imagem ilustrativa e RNM de seio dermico com trajeto fistuloso e implante de tumor dermóide intradural.

FIGURA_6-_Paciente_com_Síndrome_de_OEIS_
FIGURA_6-_Paciente_com_Síndrome_de_OEIS_

FIGURA 6: Paciente com Síndrome de OEIS e mielocistocele terminal

Dr Hamilton Matushita

PROFESSOR DOUTOR HAMILTON MATUSHITA

CRM 32.091

Considerado uma das principais referências no tratamento de crianças com patologias neurocirúrgicas no Brasil e no exterior.

Possui graduação em Medicina pela Universidade de São Paulo (1977) , Doutorado em Neurologia pela Universidade de São Paulo (1991) e Livre-Docência junto ao Departamento de Neurologia - Disciplina de Neurocirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

 

Atualmente é membro da Sociedade de Neurocirurgia do Estado de São Paulo, membro sócio da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia Pediátrica, membro titular da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia, Active Member - International Society for Pediatric Neurosurgery, membro do comitê executivo da International Society for Pediatric Neurosurgery

 

É médico titular do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, chefe do serviço de neurocirurgia do Hospital Nipo-Brasileiro, Neurocirurgião Pediátrico do Hospital Israelita Albert Einstein, membro titular do Hospital Sírio-Libanês e Coordenador do Grupo de Neurocirurgia Pediátrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

Dr Daniel Cardeal

DR. DANIEL CARDEAL

CRM 104.292

Médico que há mais de 10 anos integra a equipe coesa de neurocirurgiões formados pela Faculdade de Medicina da USP liderada pelo Prof. Dr. Hamilton Matushita.

Possui graduação pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - USP, Residência em Neurocirurgia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - USP, Título de Especialista em Neurocirurgia pela Sociedade Brasileira de Neurocirurgia - SBN.

 

Atualmente é Neurocirurgião do Grupo de emergências neurocirúrgicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, Neurocirurgião assistente do Grupo de Neurocirurgia Pediátrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, Neurocirurgião assistente nas avaliações neurocirúrgicas no Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP – ICR HCFMUSP. 

 

É membro da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia - SBN e Membro da International Society of Pediatric Neurosurgery - ISPN.

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